quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Sophie Marie - Sobre Espelhos e Poros



Sophie Marie descobrira que o fascínio narcisista que ela exprimia pelo espelho existia por conta da fotografia. Seu rosto, ainda que imperfeitamente desordenado (narinas largas, olhos pequenos, lábio torto), tornava-se fotograficamente belo. A fotografia era uma resultante no mínimo interessante, atraente; quiçá sufocantemente desejável. Ela se via além de uma mera imagem distante; explorava-se além, reparava-se adentro de seus poros, ia em cada orifício furado, cada cicatriz e marca sob a superfície de seu rosto. Ela estava fascinada por cada detalhe de sua face, que outrora fossem tão poucos. Talvez venha daí a explicação para seus retratos de rosto. Nunca imagens de corpo todo.

Sophie Marie é de alma entregue a Arte e a filosofia. Acredita que a boa música não tem nome ou endereço, mas som. Não se considera uma boa leitora (não lê muito, tampouco lê os grandes; lê 'alguns').Não recorda dados ou reminiscências, refere-se a um todo. Em grande parte do tempo, seu mundo está fotograficamente fragmentado... Marie é artisticamente contraditória. Alice? Vive a se contrariar a Arte.

Dizia eu sobre o reflexo.

Sophie Marie vivia em um mundo refletido de imagem. Imagem sua, de pescoço ahiba, com luz suave a fazer toda poesia acontecer. Seu quarto devia conter algumas dezenas de espelhos, lindamente emoldurados e mais lustrados que prata. Capazes de refletir cada imperfeição, cada perfuração. Em uma de suas escovações capilares (Sophie Marie mantinha seu corte um channel curtíssimo há cerca de 20 anos) enquanto mastigava a ponta do cabelo com o canto esquerdo da boca, ela se atreveu a se aproximar do espelho mais do que devia. 30 cm foram estão reduzidos a 15cm, 15cm a 10cm. E em 5 os poros pareciam imensos formigueiros que ao menor toque explodiriam em formigas iradas. E a pele tramada a fascinou irreversivelmente. Sophie Marie não podia ver graça em mais nada no mundo. Dali provinha a sua única e verdadeira conexão com tudo: era ela um constante formigamento prestes a eclodir.

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